- Por Eduardo Guerini
“Estes tempos são de trágica e quem sabe também saudável crise de certezas. Crise dos que acreditaram em estados que dizem ser de todos e eram de poucos, e terminaram sendo de ninguém; crise dos que acreditaram em fórmulas mágicas da luta armada; crise dos que acreditaram na via eleitoral, através de partidos que passaram a palavra ardente aos discursos de água e sal: partidos que começaram prometendo combater o sistema e terminaram administrando-o.” (Eduardo Galeano. De Pernas pro ar: a escola do mundo ao avesso. p.315)
As sucessivas tentativas de Michel Temer e sua coalizão apresentarem-se como um governo de transição, garantindo ao mercado e empresariado a capacidade de realizar as reformas estruturais e mudança de rumo na economia são ofuscadas por estatísticas nulas ou negativas.
Embora as expectativas de inflação convirjam para o centro da meta, resultado de uma forte recessão com elevado desemprego, os indicadores de consumo das famílias, do consumo do governo e dos investimentos em 2017, se comparados com igual período de 2016, apresentam nova contração com dados negativos.
A equipe econômica tenta desesperadamente utilizar dados positivos do trimestre e ano em curso, como justificativa para apoio das medidas econômicas ortodoxas de cunho monetarista e propostas de reformas estruturais que flexibilizam as relações capital-trabalho e suprimem direitos adquiridos para o sistema previdenciário, admitindo uma transição dura no sistema de seguridade social.
Os dados divulgados no relatório Focus apontam uma reversão das expectativas para o crescimento da economia brasileira em 2017 (0,40%), em 2018 está previsto um crescimento de 2.20%. As incertezas políticas diante da continuidade do corrompido e temeroso governo do PMDB, com apoio volátil de parte do PSDB, são fatores rotineiros da falta de confiança dos agentes de mercado. Os diversos analistas e formadores de opinião continuam regurgitando a tecla que existe um descasamento da economia em relação à crise política e institucional que vive o Brasil.
O regurgito da mídia chapa branca em torno das necessidades das reformas regressivas na seguridade social, a blindagem da equipe econômica é apenas uma parte do assalto aos direitos dos trabalhadores, corroborado pela passividade da população em geral, e, falta de unidade nos movimentos de oposição e das principais Centrais Sindicais do Brasil.
Os movimentos progressistas e do resto da esquerda que restou após sucessivos escândalos de corrupção deveriam se espelhar no modelo português em curso, a chamada “Geringonça”, uma aliança dos partidos de esquerda que rompeu a lógica dominante e imposição de receituário ortodoxo para economia. Em Portugal, o governo de coligação de partidos de esquerda tem governado o país na contramão das políticas de austeridade impostas pela troica – FMI, União Europeia e Banco Central Europeu. A promoção do fim dos cortes de pensões e salários, a reversão da precarização dos contratos de trabalho, a promoção de um sistema fiscal mais justo. A economia começou a crescer e o desemprego retornou aos níveis de 1990, com redução do déficit público.
Não seria o momento dos movimentos sociais ancorados nos sindicatos, federações e confederações realizarem uma nova rodada de negociação por dentro da sociedade civil, com um ajuste fiscal socialmente aceitável, dividindo a conta do ajuste, construindo um novo pacto social – a geringonça brasileira.
O protagonismo dos movimentos sociais enseja uma reversão da agenda de reformas, paralisando as duas em andamento – Trabalhista e Previdenciária, para focalizar nas reformas essenciais – a Reforma Política e Reforma Tributária. Enquanto a luta estiver institucionalizada no Congresso Nacional, no diálogo de surdos com os parlamentares corrompidos e cooptados, os trabalhadores serão vítimas de sicários no poder, esperando seguir para algum lugar, sem levar muita pedrada!!
- Eduardo Guerini, é professor da Univali e cientista político.
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